terça-feira, fevereiro 07, 2006

Cultura Digital




“O homem é um animal suspenso em teias que ele próprio teceu.”
Max Weber


Este é um conceito recente, que tem sido alvo de um processo evolutivo, perspectivado de diferentes formas.
Para Gilbeto Gil[1] ( “cultura digital é um conceito novo que parte da ideia de que a revolução das tecnologias digitais é, em essência, cultural. O que está implicado aqui é que o uso de tecnologias digitais mudam os comportamentos, o uso pleno da Internet e do software livre cria fantásticas possibilidades de democratizar os acessos à informação e ao conhecimento”.
David Porter considera que a cultura da Internet é “um produto das condições peculiares dos conhecimentos virtuais que predominam online (…) “ (James Slevin, :101 e 102)
Thompson refere que a cultura deve ser observada em três vertentes: a concepção clássica de cultura, a concepção antropológica descritiva da cultura e a concepção antropológica simbólica da cultura. No entanto, o conceito de cultura que ele prefere, mais do que uma alternativa à concepção simbólica, é uma modificação dela. O autor salienta que a Internet, como meio de comunicação e de informação de massas, permite a concentração em processos socialmente estruturados de produção, transmissão e recepção da informação, que esbatem a dicotomia produtor/ recebedor, havendo situações em que na verdade, existe entre ambos, grande interactividade.
Para Manuel Castells “a cultura da Internet é a cultura dos seus criadores.” ( 2004:55) Basta vermos a história da Internet desde o início até aos nossos dias, para percebermos, que foram, na verdade, os seus produtores, quem deu à Internet o corpo que hoje tem e a forma e cultura que lhe estão implícitas e subjacentes.
Para o autor, a “cultura da Internet caracteriza-se por ser uma estrutura em quatro estratos sobrepostos: a cultura tecnicomeritocrática, a cultura hacker, a cultura virtual e a cultura empreendedora”, (ibidem) contribuindo em conjunto para a ideologia de liberdade generalizada na Internet.
A cultura tecnomeritocrática acaba por se constituir como uma cultura hacker, por meio das normas, costumes e protocolos, generalizados nas redes de cooperação, em torno de projectos tecnológicos. A contribuição para o desenvolvimento de um projecto ou sistema tecnológico, propicia uma mais valia para esse projecto ou sistema. É uma cultura científica e tecnológica, por excelência, que actua com base na autonomia. Está assente na cultura académica. Nesta cultura “acredita-se no bem inerente ao desenvolvimento científico e tecnológico como componente-chave do progresso da humanidade”. (ibidem:58)
A cultura hacker desempenha um papel fundamental na construção da Internet. É o elo que permite a ligação entre os conhecimentos da cultura tecnicomeritocrática e os projectos empresarias que nascem e se difundem na Internet. A cultura hacker inclui, segundo Castells, citando Lévy (2001) “o conjunto de valores e crenças que surgiram das redes de programadores informáticos, interagindo on-line, em torno da sua colaboração nos projectos auto-definidos de programação criativa”. (ibidem: 61) Uma forma de compreendermos esses valores, reporta-se ao desenvolvimento do software de fonte aberta, e subsequente movimento de software livre, cada vez mais disseminado na Internet, em comunidades de trabalho em software de fonte aberta. “O hacker contribui para o desenvolvimento do software na rede à espera de reciprocidade” (Ibidem: 67). A cultura hacker, tem umas características muito peculiares em que o prestígio, a reputação e a consideração na comunidade hacker, uma comunidade global e virtual, estão relacionados com a relevância da oferta. Linus Torvalds, autor do linux, é a autoridade máxima. Para os hackers a liberdade é um valor fundamental, nomeadamente a liberdade de aceder e utilizar a tecnologia.
A cultura comunitária virtual é a dimensão social da cooperação tecnológica, fazendo da Internet um meio de interacção social, selectiva e de pertença simbólica. Esta cultura assumiu os valores tecnológicos da meritocracia, abraçou a crença dos hackers, nos valores da liberdade e da comunicação horizontal, utilizando a tecnologia com o seu potencial interactivo de comunicação assíncrona, síncrona e multi-síncrona, pondo de lado a apropriação da tecnologia pela tecnologia.
A cultura empreendedora funciona com base na cultura hacker e na cultura comunitária, para disseminar as práticas da Internet em todos os âmbitos da sociedade, com fins monetários. Os elementos desta cultura descobriram na Internet um novo planeta, em que podem controlar o mundo, fazendo uso do poder que está subjacente a esta tecnologia. Bill Gates, não sendo um produtor da Internet, em termos tecnológicos, é um bom exemplo da cultura empreendedora.
Para resumir, Castells, define a cultura da Internet como “uma cultura construída sobre a crença tecnológica no progresso humano, através da tecnologia, praticada por comunidades de hackers que prosperam num ambiente de criatividade tecnológica livre e aberta, assente em redes virtuais dedicadas a reinventar a sociedade (…)” (Ibidem:83

É justamente com esta ultima frase de Castells: “(…) em redes virtuais dedicadas a reinventar a sociedade (…) “ que vou concluir esta reflexão pessoal, sobre os textos fornecidos, que mais uma vez, me fizeram pensar em questões e oportunidades que a utilização da rede (Internet) suscita. Mudanças no relacionarmos com o outro, com o saber e com o trabalho, procurando criar ambientes apropriados à negociação de significados, à construção pessoal e social de conhecimento, ao ensino e aprendizagem significativa, ao trabalho colaborativo e à criação de comunidades de amigos ou conhecidos, que se reúnem com um objectivo em comum.
“O Outro constitui o nosso bem comum mundial mais precioso, porque é inesgotável e de uma riqueza infinita” (Quéau, 2000)

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